Sábado, 27 de
Abril de 2024
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Inspiração

Indígena do TO cria estampa de roupa e vibra ao ver Fátima Bernardes usando peça

Estampa 'Céu do Cerrado' carrega elementos do bioma que é predominante no estado. Winny Tapajós Costa diz que objetivo é representar o norte do Brasil

Foto: Divulgação
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Fátima Bernardes usou estampa criada por indígena do Tocantins

27 março, 2022

As percepções e vivências de uma ilustradora indígena de Palmas, capital do Tocantins, estão inspirando a profissional na criação de estampas para peças de roupas. Winny Tapajós Costa tem 25 anos e, na última semana, se surpreendeu ao ver que a apresentadora Fátima Bernardes usava uma das estampas criadas por ela. A estampa é chamada 'Céu do Cerrado' e carrega elementos do bioma que é predominante no Estado. Winny é do povo Tapajós, que vive na aldeia Karidade localizada no território indígena Cobra Grande, em Santarém (PA) e se mudou para o Tocantins ainda criança. Ela diz que desde que começou a trabalhar no processo criativo de estampas busca, em todos os trabalhos, representar povos e culturas que não costumam ter visibilidade. "A minha maior inspiração é o nosso bioma e a cultura indígena. Minha raiz é no Tocantins, no norte do Brasil e no Pará. Minha vida está aqui. Toda a nossa cultura e o que envolve estar vivendo no norte é o que me da forças para seguir e viver. Meu foco é representar as coisas que me encantam", disse a indígena.

Estampa no look de Fátima Bernardes
A estampa 'Céu do Cerrado', além de ter sido a primeira criação de Winny também foi muito compartilhada no Tocantins após Fátima Bernardes aparecer usando um macacão com desenhos assinado pela artista, no programa Encontro do dia 17 de março. Winny conta que se surpreendeu ao receber mensagens e fotos de amigos nas redes sociais. "Quando me mandaram eu fiquei muito feliz. Fiquei feliz por ela usar uma estampa que desenhei e mais feliz ainda das pessoas acharem o máximo. O que me encanta no final das contas é o encanto no olhar das pessoas. Aparentemente agradou muita gente e fico muito feliz quando me falam que finalmente se sentiram representadas por uma estampa", disse. Formada também em arquitetura e urbanismo pela Universidade Federal do Tocantins (UFT), a jovem começou a trabalhar com a criação de estampas em 2020, quando aperfeiçoou traços e venceu o concurso da Farm, marca de roupas que trabalha com conceito de sustentabilidade. Durante o concurso ela iniciou o processo de criação da primeira estampa. Um ano depois começou a trabalhar na empresa, viu sua arte estampada em peças, sendo vendidas e até usadas em rede nacional. A jovem conta que tudo aconteceu muito rápido. "No mesmo ano que passei no concurso foi o ano que comecei a ilustrar. Um dos prêmios do concurso era participar do processo criativo de uma estampa e eu acho que foi nesse momento que a gente 'deu match'. O pessoal da empresa e eu, a gente se encontrou muito nesse processo criativo. Na forma de criação, nas referências, na criatividade, na beleza de se criar. A partir desse concurso a gente criou uma estampa juntos e eles acabaram me chamando para trabalhar", explicou. Winny diz que aproveitou a oportunidade e o conceito da marca para trabalhar com referências e tentar fazer com que mais pessoas se sintam representadas. "Me vi em uma posição muito importante. Percebi que a minha arte poderia ter um alcance muito maior e me sinto na obrigação de representar, de forma muito respeitosa e delicada, toda a nossa simbologia. Sinto que a gente é um pouco carente em representação brasileira. Às vezes as pessoas acham que o Brasil é só sul e sudeste e esquecem que existe muito mais. Quero mostrar que esse outro Brasil também existe", disse Apesar do talento e da força das ideias, ela conta que as estampas com elementos da cultura indígena não são expostas. "São artes muito pessoais e não quero transformar isso em um comércio. Quero que seja algo genuíno e que seja feito para as pessoas apreciarem e não para comprar e falar que possui uma arte indígena", disse Winny. Apesar das críticas que os povos indígenas recebem diariamente, ela afirma que não segue padrões e estereótipos impostos pela sociedade. "Não seguimos essa ideia de que o indígena não pode usar tecnologia, não pode viver na cidade, anda pelado, caça com arco e flexa. A gente não vive em 1500. Existem esses indígenas, mas também tem os que moram na cidade e isso não nos faz menos indígenas. A gente teve que se adequar, e temos liberdade assim como um branco. Nada tira a minha etnia, minhas crenças e meu sangue", afirmou. A jovem conta que criou toda a estampa durante o concurso que participou em 2020. Até a peça ser lançada ela recebeu dicas para enriquecer os elementos, colorir e na finalizar. "Coloquei pequi, tem babaçu, lobo-guará, buriti, capim dourado, sempre-viva. Coloquei tudo no meio e a gente foi montando a estampa até chegar nesse resultado. Fui desenhando no papel, mostrava, a gente foi criando junto. Como tinha certeza que seria a minha única criação para a marca eu realmente me entreguei para esse processo criativo e falei: 'vamos ter uma estampa do cerrado'", explicou. Winny diz que entende que não se trata de dom, mas de esforço para conseguir obter resultados. "Eu não nasci desenhando. Sempre gostei de arte e por causa disso pratiquei e a prática me trouxe as habilidades que tenho hoje". Sem ambições, o desejo da jovem indígena é continuar evoluindo como profissional, ilustradora e designer de estamparia. "Já aconteceu tudo que eu almejava. Já consigo pagar minhas contas, me sinto valorizada enquanto profissional e me sinto feliz com o meu trabalho. Tudo que vier a partir de agora vai ser lucro. Então ótimo se acontecer algo maior que isso", finalizou Winny.